O processo de migração das empresas brasileiras para o novo Sistema
Público de Escrituração Digital (Sped) envolve uma grande transformação
cultural no ambiente corporativo. Saem de cena toneladas de papel em forma de
notas fiscais e livros de registros contábeis. E entra um universo digital, com
lançamentos feitos por meio magnético e processamentos e transmissão de
informações via sistemas eletrônicos e internet.
O Sped teve início com o projeto das Notas Fiscais Eletrônicas (NF-e),
concebido em 2005 e em vigor desde setembro de 2006. As NF-e são utilizadas
principalmente nas operações que envolvem transações comerciais entre empresas
e têm como objetivo o controle do ICMS e do IPI.
Foi o primeiro passo na busca por maior integração dos fiscos, com padronização
e compartilhamento de dados contábeis e fiscais.
A partir de 2007, o programa foi incluído no Programa de Aceleração de
Crescimento (PAC), com dois novos projetos: a Escrituração Digital
Contábil (Sped Contábil) e a Fiscal (Sped Fiscal). O objetivo: racionalizar e
uniformizar todo o trabalho das empresas nessas áreas, preparando-as para uma
transmissão única aos diferentes órgãos fiscalizadores. Dentro de um processo
de desburocratização tanto das empresas como do Fisco, o Sped busca
conferir maior transparência a essas operações e, sobretudo, facilitar a
fiscalização, reduzindo as fraudes.
O resultado até o momento, segundo dados da Receita Federal, são mais de
680 mil estabelecimentos em todo o país emitindo a NF-e. Em cinco anos, foram
mais de 3,3 bilhões de notas emitidas e validadas pelas Secretarias da
Fazenda dos Estados e pela Receita Federal. No caso do Sped-Contábil - que a
partir de 2010 tornou obrigatória a entrega digital de dados de pessoas
jurídicas sujeitas à tributação do Imposto de Renda com
base no lucro real - o saldo também é significativo: em 2011, mais de 150 mil
empresas enviaram dados para a Receita Federal no novo formato, o que representou
um total de 237.572 livros digitais.
Já o projeto do Sped-Fiscal, que possibilita à Receita e às Secretarias de
fazendas dos Estados e Distrito Federal terem acesso a todos os documentos
fiscais emitidos e recebidos pelos estabelecimentos, assim como os dados da
apuração do ICMS e IPI, e que devem ser enviados
mensalmente via internet, fechou setembro com a participação de
mais de 180 mil empresas, que enviaram 880 mil arquivos digitais.
Todos esses números são avaliados como um bom começo, mesmo considerando
a demora do país para ingressar na era digital. "Outros países como Chile
e o México já estavam na era digital. O Brasil, porém, tem uma estrutura
tributária e fiscal muito mais complexa, com uma diversidade maior de tributos,
de obrigações acessórias e de autoridades fiscais. Para ingressar na
escrituração digital, foi preciso elaborar seu próprio modelo, sem poder
importar soluções", afirma a professora Marta Pelúcio, especialista em
gestão tributária da Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (Fipecafi).
"A saída das informações do papel para o meio magnético, dentro de
um layout, de um padrão criado pelo governo, facilita a integração da base
de dados e diminui as chances de erros, o que é bom para todos", afirma a
professora.
Para Renato Martini, presidente do Instituto Nacional de Tecnologia
da Informação (ITI), o processo de "desmaterialização" das
notas fiscais e da escrituração contábil e fiscal tem tido êxito e aceitação
pelos contribuintes. "O país possui a plataforma tecnológica e a
legislação necessárias para realizar essa conversão, que trará mais efetividade
à tributação."
O ITI é um dos elos da cadeia digital: enquanto autarquia federal vinculada
à Casa Civil da Presidência da República, mantém a infraestrutura das
Chaves Públicas Brasileiras (ICP-Brasil), a base da certificação
digital no país.
Dentro do processo de migração para o Sped, o instituto colaborou na
formatação do layout da NF-e e é responsável por regular e credenciar as
autoridades certificadoras - como a Serasa Experian e a Certisign -
que fornecem os certificados digitais aos estabelecimentos emissores de NF-e.
"Os certificados são a assinatura digital das empresas e, dentro dos
padrões estabelecidos pelo ITI e pela legislação, conferem a validade jurídica
necessária aos documentos digitais", explica Martini. Sem esse primeiro
passo não seria possível migrar para o mundo digital.
O custo médio de um certificado digital é de R$ 400, mas os valores
variam de acordo com o prazo de validade e a mídia utilizada para o certificado
(pode ser cartão, tolken ou o próprio computador). Hoje, segundo Igor Rocha,
presidente de identidade digital da Serasa Experian, o
certificado é visto já como um insumo para as empresas, pois a migração para o
Sped é vista como um avanço. "São várias as etapas no processo de
adaptação às NF-e. Apesar de já estar bem desenvolvido, ainda há pontos a serem
solucionados, como o acompanhamento da validação e o armazenamento dos
arquivos", diz.
Para a Certisign,
o mercado de certificação digital deve continuar a crescer 20%
ao ano. "A Certisign já emitiu mais de 400 mil
certificados que podem ser utilizados nos sistemas das NF-e. Mas ainda há muito
a crescer", afirma o vice-presidente de planejamento estratégico da
empresa, Paulo Kulivosky.
Nenhum comentário:
Postar um comentário