Em
contraste com as incertezas no cenário externo, o mercado brasileiro de
captações de instrumentos de renda fixa, como debêntures, notas promissórias e
fundos de recebíveis, está ativo e com ampla liquidez. Empresas pretendem
aproveitar o grande apetite de investidores locais por papéis de crédito
privado e se preparam para captar um total de R$ 10 bilhões nos próximos meses.
Desse volume, aproximadamente R$ 6 bilhões devem sair ainda neste ano.
Além
de nomes recorrentes, como empresas do setor elétrico e outras concessionárias
de serviços públicos, o mercado terá operações de estreantes, como o
laboratório Fleury, que emitirá R$ 450 milhões em debêntures, e a Cedae,
empresa de saneamento do Rio de Janeiro que pretende captar R$ 1,140 bilhão via
Fundo de Investimento em Direitos Creditórios.
A
lista de emissores conta ainda com nomes considerados nobres, como a Petrobras,
que pretende captar R$ 300 milhões por meio de certificados de recebíveis
imobiliários (CRI). Os papéis possuem lastro nos aluguéis da sede da estatal em
Santos, no litoral paulista.
O Valor
apurou que outros nomes são esperados para as próximas semanas, como a empresa
de planos de saúde Amil e a operadora de telefonia Oi, que pretende captar R$ 1
bilhão com prazo de sete anos. Entre as operações aguardadas está ainda a
Rodovias do Tietê, que deve realizar uma emissão de debêntures com prazo de 12
anos, nos moldes das realizadas por Rota das Bandeiras e Ecopistas, que deve
sair no início de 2012.
O
volume de emissões previsto não considera emissões de títulos que não serão
vendidos diretamente no mercado, como as debêntures de R$ 20 bilhões da Dibens
Leasing, que ficarão integralmente com o Itaú, controlador da empresa, e serão
usadas posteriormente como fonte alternativa de captação do banco.
Com a
oportunidade aberta, as companhias decidiram apressar as operações para
fechá-las antes da virada do ano e, com isso, melhorar os balanços que serão
apresentados ao mercado no início de 2012. Um dos objetivos das captações, no
caso das debêntures, é justamente a rolagem de dívidas que vencem em prazo mais
curto.
O
grande número de operações em andamento deve levar a uma concentração no fim do
ano. "Dezembro caminha para ser o melhor mês do ano para as
emissões", afirma o diretor de renda fixa do Bradesco BBI, Leandro
Miranda. Com as festas de fim de ano nas últimas duas semanas de 2011, o
calendário para as captações termina em 16 de dezembro.
As
incertezas com relação à crise da dívida europeia, que praticamente paralisaram
as captações externas, também estimulam as emissões no mercado local, de acordo
com o executivo. "Algumas empresas optaram por fazer uma emissão de notas
promissórias com possibilidade de resgate antecipado caso se abra uma janela de
oportunidade no exterior", diz.
A
necessidade de captação das empresas casa com a demanda dos investidores, em
especial fundos de investimento. "Com a queda da bolsa, houve uma migração
de recursos para a renda fixa", destaca Daniel Vaz, responsável pela área
de renda fixa do BTG Pactual.
O
processo de queda da taxa de juros é outro fator que estimula a busca por
alternativas de investimento com maior potencial de retorno. Uma redução mais
expressiva da taxa, contudo, pode ter um efeito contrário, já que estimularia a
saída dos fundos para a caderneta de poupança, segundo Vaz.
"Caso
os fundos sofram resgate, os gestores passarão de compradores a vendedores de
papéis", afirma. O executivo do BTG avalia, porém, que esse risco só deve
entrar no radar a partir do segundo semestre do ano que vem. Para ele, uma
ameaça a esse mercado no curto prazo é um possível agravamento da crise da
dívida.
Apesar
do apetite pelas emissões, a concentração de operações em andamento deve
proporcionar um maior poder de barganha para os investidores. Pelo menos é o
que esperam gestores de recursos ouvidos. As taxas oferecidas em algumas
captações trazidas pelos bancos de investimento são consideradas
"agressivas" pelo mercado. "Tenho interesse nas emissões, mas
vou concentrar meus esforços nas operações que oferecerem o melhor prêmio com o
menor grau de risco", afirmou o profissional de uma casa de gestão de
recursos que preferiu não ser identificado.
Os
investidores, de fato, têm se mostrado mais sensíveis a risco, como reflexo das
incertezas no cenário externo. Não por acaso, praticamente todos os nomes que
pretendem vir a mercado possuem rating mínimo de 'AA', na escala nacional.
Um
sinal da maior restrição foi a emissão de R$ 500 milhões em debêntures da
locadora de veículos Unidas, realizada no mês passado. A operação, que contava
com classificação de risco 'A-', não teve demanda do mercado e precisou ser
absorvida pelos bancos coordenadores da operação.
Como
a maior parte dos emissores possui boa qualidade de crédito, a taxa oferecida
aos investidores será determinante para o sucesso das captações, segundo o
superintendente executivo de mercado de capitais do HSBC, Antonio Oliveira.
"Diante da quantidade de emissões previstas nas próximas semanas,
orientamos as empresas que nos consultam hoje a deixar a operação para o início
do ano que vem."
Uma
outra opção neste momento, segundo o executivo, é fazer a chamada
"operação de balanço", quando os papéis ficam com o próprio banco ou
com um consórcio de instituições, semelhante a uma linha de crédito, com a
vantagem fiscal da não incidência do IOF.
Mas
nem todos os emissores têm considerado o momento oportuno para captar. É o caso
da operadora de telefonia CTBC, do grupo Algar, que decidiu não levar adiante
os planos de captar R$ 120 milhões em debêntures, por avaliar que as condições
oferecidas não eram satisfatórias.
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